10/04/2014
Conhecendo a Irlanda: Dublin 1913 Lockout
A Irlanda é um país fascinante e cheio de história que vai desde o período neolítico até hoje, com diversos momentos de grande agito político, em especial o começo do século XX, quando a República da Irlanda foi fundada e conseguiu sua independência.
Um dos eventos mais relevantes do século passado foi o movimento operário mais revolucionário do país – o Dublin 1913 Lock-out – um marco na história irlandesa que representa a fundação e luta pelos direitos trabalhistas em um país que passava por um de seus piores momentos.
Condições de trabalho em Dublin em 1913
Em 1913 as condições de vida em Dublin eram péssimas para a maioria das pessoas. A população vivia em cortiços nas regiões centrais da cidade, sem saneamento básico, com uma altíssima taxa de mortalidade (especialmente infantil) e sem oportunidades de trabalho, principalmente para a mão-de-obra não qualificada.
James Larkin e as Uniões Trabalhistas
James Larkin foi um irlandês nascido em Liverpool que se tornou um dos personagens principais durante o Dublin Lock-out. Sua visão socialista e crenças nos direitos trabalhistas firmaram seu prestígio e nome no Reino Unido e também na Irlanda.
Ao chegar em Dublin em 1908, Larkin se indignou com as condições de trabalho dos operários que viviam à mercê dos empregadores, trabalhando até 17 horas por dia por valores absurdos e ameaçados pela falta de oportunidades. Foi então que ele fundou a União Geral Irlandesa de Trabalhadores do Transporte (ITGWU), o primeiro sindicato trabalhista da Irlanda para mão-de-obra qualificada e não qualificada, obtendo, em apenas 5 anos mais de 10 mil membros.
Larkin também fundou o Partido Trabalhista da Irlanda juntamente com James Connolly e a União de Trabalhadores da Irlanda que promoviam greves – tradicionais e simbólicas – como forma de reivindicação de condições trabalhistas mais justas.
O Lock-out
Toda essa agitação gerou preocupação entre empregadores que decidiram tomar medidas drásticas contra a política proposta pelas uniões e sindicatos.
Mais de 300 comerciantes e manufaturas se reuniram, liderados por William Martin Murphy, um dos maiores empreendedores da época (presidente da Dublin United Tramway Company, dono da loja de departamento Clery’s e do Imperial Hotel, além de ter controle sobre os jornais Irish Independent, Evening Herald e Irish Catholic) e bloquearam (ou seja, locked-out, em inglês) o acesso de seus operários ao trabalho em função de qualquer envolvimento com as uniões trabalhistas, demitindo centenas de operários semanalmente.
A Igreja Católica apoiava o lock-out e chegou a cancelar um programa que dava apoio completo às crianças de operários em greve alegando que o contato com outras influências religiosas seriam prejudiciais à formação das crianças. Os operários não tinham mais recursos para viver a não ser os oferecidos pelas uniões.
Bloody Sunday e ataques
Infelizmente a tensão se tornou cada vez mais forte entre operários e em agosto de 1913 houve um Comício Trabalhista onde é hoje a O’Connell Street. A Policia Metropolitana de Dublin foi chamada para dispersar as pessoas presentes utilizando porretes e o resultado foi um dos mais grotescos da história do país. Foram mais de 300 feridos incluindo duas mortes, tornando o dia 26 de agosto de 1913 no primeiro “Bloody Sunday” da Irlanda.
Larkin e Connolly se viram na obrigação de modificar essa situação e fundaram o Irish Citizen Army (Exército de Cidadãos Irlandeses), que mais tarde teve um papel essencial no Levante de 1916.
Conseqüências do Lock-out
O período de disputa entre empregadores e operários terminou somente no final de janeiro de 1914, causando terríveis conseqüências para todos.
Os operários que já viviam à beira da sociedade foram encurralados pela pressão dos empregadores e retornaram ao trabalho resignando qualquer associação às uniões e os comerciantes e manufaturas foram altamente prejudicados pela falta de trabalho, práticas de bloqueio e pelas greves, que levaram muitos à falência.
Embora as manifestações contra o lock-out de 1913 tenham sido reprimidas o evento marcou a história do país, modificando as práticas trabalhistas abusivas e resultando em melhores salários e condições de trabalho. Além de tudo, a constante luta pelo direito de uma vida melhor estabeleceu o espírito de solidariedade entre a classe operária.
Curiosidades e coisas para você ver/fazer
As fotos utilizadas neste artigo são de uma exposição muito interessante, feita toda em painéis bordados (UAU!) sobre os eventos do Dublin Lock-out. Atualmente dentro do GPO.
James Larkin (Big Jim) é homenageado por uma estátua na O’Connell Street e o túmulo dele fica no conhecido (e interessante) Glasnevin Cemetery.
O Liberty Hall, o atual prédio da União Comercial da Irlanda, ganhou no ano passado imagens sobre o Dublin Lock-out, confira uma pequena matéria do site da RTE
A National Library of Ireland está com uma exposição bastante completa e fantástica sobre o Dublin Lockout até o final de 2014. Veja mais aqui.
Os correios produziram uma edição especial de selos, disponíveis para compra, comemorando o centenário do Dublin Lock-out. Veja só:
É impressionante como mesmo depois de tantos anos morando na Irlanda me surpreendo com novas informações, curiosidades e com a história dessa nação lutadora, solidária e apaixonada, provando que a Irlanda tem realmente muito a oferecer.
Conheça mais a Irlanda!
Postado por: Tarsila | Comments (2)
Sorry, the comment form is closed at this time.
Ahhhhhhhhh, muito legal! Naquele festival Jameson Movie que teve recentemente eu fui ver um filme que falava justamente sobre isso e deu pra ter uma boa ideia do lockout. Os atores no filme são muito bons e ficaram muito parecidos com os “personagens” da história real. Dublin é realmente fascinante e tem sempre coisa nova a ser aprendida por aqui! 🙂
Comentário by Bárbara Hernandes — 10/04/2014 @ 10:05 pm
Olá Bárbara!
Que bom que gostou do artigo. O Jameson Film Festival é realmente excelente e oferece cada oportunidade bacana. Você lembra qual foi o filme que você viu sobre o Lockout?
Beijinhos
Comentário by Tarsila — 21/05/2014 @ 6:05 pm